Para uns, ele é um homem desalmado, sem coração, que se diverte deliberadamente com o sofrimento alheio; egoísta, manipulador, cafajeste, errado, ruim. Mas o que há por detrás daquele belo par de olhos azuis realmente? O que se passa na cabeça dele? É o que eu tentarei explicar.
Egoísta, mas quanto?
Ninguém precisa dizer que não ou que sim; egoísmo é, de fato, um traço característico da personalidade de James "Sawyer" Ford. Mas eu lhes pergunto, quanto? Até que ponto Sawyer é realmente egoísta? Até que ponto ele pensa somente em si mesmo, e só faz algo para alguém se, em troca, ele ganhar algo?
Vamos analisar alguns pontos. Ele roubava coisas dos corpos na fuselagem, as mantinha para si e nada mais. Não é das atitudes mais admiráveis, certo? Mas vejamos: um egoísta salvaria a vida de alguém? Mais, daria a sua própria para salvar alguém? A definição no dicionário de egoísmo é:
egoísmo
do Lat. ego, eu
s. m.,
amor próprio excessivo, que leva o indivíduo a olhar unicamente para os seus interesses em detrimento dos alheios;
conjunto de propensões ou instintos que levam à conservação do indivíduo.
Estaria nos interesses de Sawyer morrer por Kate? Salvar a vida de Michael quando eles se acidentaram na jangada? Dar para Sun o teste de gravidez, a Kate uma arma para seguir com Claire para a floresta, ler para Aaron, oferecer remédio para Claire quando Aaron estava doente, voltar para o acampamento para salvar seu amigos, mesmo podendo morrer? Acho que não. Isso não é típico de um egoísta, um verdadeiro egoísta. Então o que explicaria isso, vindo de Sawyer?
Ele não teve alguém para lhe dizer que dividir é bom. Que se deve compartilhar as coisas com as pessoas, ser prestativo. Tudo isso se aprende na infância, com os pais, mas... ele perdeu os pais. Com oito anos. Os pais na vida de uma criança são imprescindíveis para sua formação de carácter, de conceitos, de deveres, de consciência social. Se ele não teve ninguém que lhe ajudasse a ver isso, como ele poderia ser diferente? Então ele cresce cuidado de si; seu princípio é sobreviver, seja como for. Seja não dividindo, seja enganando, manipulando. E para ele, ele só estava sobrevivendo; era perfeitamente normal enganar alguém para conseguir 9 mil dólares só porque ele precisa. Ninguém lhe disse ao contrário. Bem, quase ninguém.
Toda pessoa que transgride a lei é punida. Seja da forma pura e simples da punição, como a prisão, tanto da forma subjectiva. Nenhuma pessoa que tem sentimentos se sente bem em fazer algo ruim; somente pessoas com um perfil psicológico de um psicopata se sentem absolutamente normais quando matam alguém, por exemplo. Sawyer está longe de ser um psicopata, mas também está longe de ser uma pessoa comum: ele aprendeu, a duras penas, que o que ele fazia era errado. Mas isso não o fez ser alguém melhor, não o fez pensar em seus atos; sentir-se mal consigo mesmo era exatamente o que ele queria. Quando ele assumiu a identidade do homem que ele mais odiava, o homem responsável pela morte de seus pais, ele estava se punindo. Ele estava fazendo as pessoas o odiarem porque, de uma estranha forma, punir ele como Sawyer era punir o verdadeiro Sawyer. Ele se pune pensando em si mesmo, e em seu alter ego.
Mas é claro, seu passado difícil e seu desejo de auto-punição nunca iram justificar seus atos. Nunca. Eu não estou tentando ser a advogada do diabo, dizendo que ele faz isso porque ele teve um passado ruim. Isso não justifica seus atos, mas nos faz entender seus atos. Ele não é do jeito que é porque quer, porque é alguém puramente mal. Ele é assim por causa das circunstâncias de seu passado. Isso explica, mas não justifica.
Sawyer e os apelidos
Outro traço característico de Sawyer são os apelidos. Desde o começo da série, ele os distribui para todos os lados, não importando quem. Desde o afetuoso Freckles, dado para Kate, até o engraçado mas debochado Jackass para Jack, Jabba para Hurley, etc. E por que? Porque é uma forma de agressão, na maioria das vezes. É uma forma de ridicularizar o outro, o deixando irritado, desgostoso. É uma forma de afastar as pessoas dele; longe dele, elas não teriam que ouvir os insultos. Era isso que ele queria; as pessoas afastadas, o máximo possível. O contato social íntimo, a sensação de amizade e ligação com alguém não lhe agrada; ele quer que todos o detestem, o vejam como o bad guy, o vilão. Somente porque acha que ele não pode fazer algo bom para alguém, que não é capaz de um gesto de bondade, somente porque ele acha que é ruim. Ele quer afastar as pessoas do monstro que ele acha que é, mas que não é realmente. Ele finge ser um monstro, alguém sem sentimentos ou escrúpulos, mas ele não é assim, totalmente. Agir desse modo é sua armadura contra as pessoas. Fiquem longe de mim, seus idiotas, eu só vou lhe fazer sofrer! é o que ele diz com essas atitudes.
Passado x Caráter Até que ponto seu passado pode moldar quem você é? Até quando você é o que você quer, ou você é o que você faz?
Imagine-se com oito anos. Você depende muito de sua mãe e de seu pai. Você os ama, mais que tudo. Seu pai é seu herói, seu exemplo, sua mãe sua rainha. Você vê o mundo como um conto de fadas, onde seu pai é o cavaleiro que te defende dos dragões. Mas o cavaleiro não mata a rainha, mata?
Imagine-se vendo seu pai brigar com sua mãe, gritar com ela. Eles não deveriam fazer isso. Imagine você ouvir seu pai matar sua mãe, depois se matar.
Imagine-se temendo seu pai. Seu próprio pai.
Imagine-se sentir sozinho no mundo. E com oito anos.
Uma criança que passou por tudo isso terá um trauma para sempre; ela não tem um porto seguro, não tem amor. É notório que sim, há pessoas que passaram por traumas horríveis mas não são criminosas. E qual a diferença?
Peguemos o exemplo de um menino que more na favela. Ele vê seu pai trabalhar de sol a sol, e ainda é pobre. Bate na mãe. Bebe. E ele vê o traficante; rico, bem-sucedido, rodeado de mulheres. Quem será o exemplo para ele? Quem ele vai querer ser quando crescer? Quem é seu ídolo? Infelizmente, o traficante. Porque o pai representa a derrota para ele, e o traficante o sucesso.
Agora pensemos em Sawyer. Ou melhor, James. O seu pai, o seu ídolo, brigava com a mãe. Provavelmente houveram várias brigas. Ele se matou, e a mãe dele. Ele era a derrota, tudo de ruim que ele não queria lembrar. Ela era tudo o que ele não queria ser. Mas veio Sawyer, Anthony Cooper, ou qualquer que seja o nome dele. Ele ganhava dinheiro. Tinha mulheres. Porque não ser ele? Cooper era o único exemplo de homem que James tinha para si. Mesmo o odiando mortalmente, ele se tornou o outro. Escolhas erradas acarretaram um molde de caráter extremamente complexo e perverso. Novamente, nada justifica, mas explica.
No caminho da Redenção Sawyer tem mudado muito ultimamente; está menos ácido, mais prestativo e sociável. A que se deve essa mudança? Eu diria quem: Kate.
O motivo de eu gostar tanto de Sawyer é sua complexidade; é ele ser o anti-herói que é capaz de falar que a mulher que ele ama tem gosto de morangos. Mas também capaz de planos mirabolantes, de sarcasmo único, e claro, de ser tão hot. Na minha opinião, nunca haverá um pernsonagem como ele; ele faz tantas coisas erradas e ainda é um dos mais populares. As pessoas torcem por ele. Tudo porque ele não é o vilão; ele tem seu lado bom, e quem o está ajudando a mostrar esse lado é Kate.
Ele nunca amou realmente uma mulher. Nunca esteve em um relacionamento sólido. Mas com Kate é diferente... desde o começo ele demonstrou interesse por ela. Claro, inicialmente era puro jogo de sedução, ela era um prêmio, mais uma. Mas quando ela descobriu quem ele era de verdade, o homem por detrás do monstro, tudo mudou. Kate o entende; vê quem ele realmente é. Sabe que ele pode ser bom. E é por isso que ele a ama; ela ama o James, não o Sawyer. Ou melhor, ela conhece James e Sawyer e mesmo assim ainda está por perto. Ela não se afasta. Ela não corre. Ela permanece, algo que ninguém nunca fez.
Por se gosta de alguém pelas qualidades, mas se ama pelos defeitos.
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Enviado por Aika
em domingo, 19 de agosto de 2007 às
11:18/